Como os “Irmãos da Tecnologia” tomaram conta do Vale do Silício

Por Rico Olivetti

Nos últimos anos, um novo fenômeno tomou conta do Vale do Silício: a ascensão dos chamados “Technology Brothers” — um grupo coeso, embora informal, de empreendedores, investidores e influenciadores digitais que, unidos por uma estética tecnológica agressiva e uma mentalidade libertária, redefiniram os rumos da indústria de tecnologia.

Quem são os “Technology Brothers”?

O termo, inicialmente usado de forma pejorativa em fóruns e redes sociais, acabou sendo apropriado por esses próprios agentes como símbolo de uma nova era. Diferente dos nerds introspectivos que dominaram o Vale do Silício nas décadas passadas, os “Tech Bros” combinam uma cultura startup ultracompetitiva com estilos de vida expostos publicamente, culto ao físico, gosto por podcasts longos sobre inteligência artificial e entusiasmo por tecnologias disruptivas como blockchain e biohacking.

Muitos deles começaram como desenvolvedores ou engenheiros, mas logo migraram para cargos de liderança, fundando empresas e movimentando investimentos bilionários em setores como fintech, inteligência artificial, Web3, saúde e biotecnologia.

A estratégia: redes sociais e capital de risco

A ascensão dos “Technology Brothers” está intrinsecamente ligada ao domínio das redes sociais como plataforma de influência. Diferente das figuras lendárias do passado, como Steve Jobs ou Bill Gates, cuja influência era construída pela inovação e pelo tempo, os “Tech Bros” utilizam Twitter (ou X), Substack, podcasts e newsletters para construir suas marcas pessoais em tempo real.

Nomes como Elon Musk, David Sacks, Chamath Palihapitiya e Balaji Srinivasan exemplificam essa tendência. Todos dominam tanto a retórica pública quanto as estratégias de investimento, alternando entre influenciadores digitais, fundadores visionários e investidores estratégicos.

Além disso, muitos criaram fundos de venture capital, aceleradoras e coletivos que fomentam novos empreendedores, criando um ecossistema fechado, onde o networking se transforma rapidamente em investimento e, consequentemente, em mais poder.

A visão ideológica: do libertarianismo ao “techno-otimismo”

Ideologicamente, os “Technology Brothers” compartilham uma visão profundamente otimista em relação à tecnologia como força transformadora da sociedade, muitas vezes sem depender das regulações tradicionais do Estado. Muitos defendem modelos de governança alternativos, como cidades privadas ou nações digitais, inspiradas em conceitos como criptoanarquismo e “seasteading”.

Ao mesmo tempo, a defesa de um “techno-otimismo” agressivo gera críticas sobre a falta de responsabilidade social, principalmente quando se trata de temas como privacidade, desigualdade social e impactos ambientais.

A captura do Vale do Silício

A influência dos “Technology Brothers” sobre o Vale do Silício se dá em três eixos principais:

  1. Financeiro: com a proliferação de venture funds e investimentos anjo, eles passaram a dominar as principais rodadas de capital das startups mais promissoras.
  2. Cultural: estabeleceram uma nova estética empreendedora, mais ousada e menos dependente dos moldes acadêmicos tradicionais. A cultura do “fail fast” (falhe rápido) e da experimentação extrema é uma marca desse grupo.
  3. Tecnológico: muitos lideram o desenvolvimento das principais frentes tecnológicas atuais — inteligência artificial generativa, computação quântica, descentralização financeira, e biotecnologia.

Críticas e o futuro

Embora admirados por muitos, os “Technology Brothers” também são alvo de críticas intensas. Especialistas apontam que a cultura excessivamente agressiva e competitiva promove ambientes tóxicos e práticas pouco éticas em algumas startups.

Além disso, a busca incessante por disrupção pode desconsiderar aspectos fundamentais, como o impacto social e ético das tecnologias desenvolvidas. O colapso de algumas startups altamente promovidas por esse grupo — como o caso da FTX, no setor cripto — levantou alertas sobre os riscos dessa nova cultura.

Ainda assim, a influência dos “Technology Brothers” no Vale do Silício parece longe de diminuir. Com investimentos em inteligência artificial, neurotecnologia e até projetos espaciais, eles estão moldando o futuro não apenas da tecnologia, mas possivelmente do próprio modelo de sociedade.

Um fenômeno

O fenômeno dos “Technology Brothers” representa uma transformação profunda na dinâmica do Vale do Silício: um modelo em que liderança tecnológica, influência midiática e capital financeiro se entrelaçam como nunca antes. Resta saber se este movimento será lembrado como o motor de uma nova era de progresso ou como o epicentro de novas crises e desigualdades.